Duas coisas nessa pandemia me surpreenderam.
1 – O número de mortos está sendo bem maior do que eu esperava.
Diante do que havia ocorrido na China (pelo menos o que chegou até nós via OMS) minha aposta é que mataria no máximo o dobro do que o H1N1.
Evidente que já seria um estrago terrível, mas o Covid virou uma das maiores tragédias dos últimos tempos.
2 – Eu tenho medo da morte, mas é algo TÃO INEVITÁVEL que sempre pensei muito nela então desenvolvi uma preparação mental.
Tenho mais medo da “passagem” (morte lenta ou rápida) do que da morte em si.
Que o medo da morte é comum a toda humanidade é óbvio, mas a pandemia me mostrou o PAVOR de muitos ... um medo elevado a décima potência.
As pessoas não suportam nem pensar na hipótese que podem morrer!!
Tá, a mídia colaborou bastante para que o pânico se estabelecesse, mas o ingrediente principal é o medo doentio de morrer.
Preciso escrever mais sobre a morte, a humanidade precisa aceitar melhor esta inevitabilidade.
As pessoas tem essa ilusão de “eternidade biológica” totalmente ilógica ... isso atrapalha o melhor planejamento da vida.
😠
“Queria ver se alguém muito próximo de
você morresse!”
Me escreveram bastante isso.
Muitas pessoas próximas já morreram.
Entre tantos, um irmão, avós, pai e mãe, sogro, tios,
cunhadas, primos, colegas de trabalho, escola, igreja, vizinhos.
É uma lista grande a qual não gosto de ficar remoendo na memória.
Se por acaso lembro de alguém, apenas desejo
que esteja em paz, tento pensar em outra coisa.
O que sinto?
A morte é algo tão natural na minha mente que
depois da tristeza inicial, aceito bem.
A pessoa existia ... não existe
mais.
A princípio, quanto mais a pessoa está fazendo
parte da nossa vida, mais sentimos.
Um colega do atual emprego que morresse, pela
proximidade, me deixaria mais abalado que um de outro emprego que há tempos não
vejo.
Mas vamos onde nenhuma mente aceita ir…
Aqui em casa a situação hoje (7 de maio 2020)
é a seguinte:
● Trabalhando em um
hospital, quarentena pra mim até agora não foi possível.
Se eu ficar em casa cada dia de trabalho será
descontado, logo, se eu pegar Covid não é por irresponsabilidade, muito pelo
contrário, estou fazendo o que preciso fazer.
● A empresa que minha
esposa trabalha, deu férias, acrescentou mais uns dias, quase que ela teve o
contrato de trabalho suspenso (ainda há essa possibilidade).
Entretanto,
o setor que ela está locada (pneus de moto) está funcionando por enquanto.
Suponho que com tantos entregadores usando
motos, o gasto de pneus para esse tipo de veículo aumentou, eles precisam desse
produto.
Minha esposa ficou em casa o quanto pode, mas
está fazendo o que é preciso fazer, voltou a trabalhar
● Uma das minhas
filhas trabalha em farmácia, outra atividade que não foi interrompida.
Para ela quarentena ainda não foi possível.
Quando eu ou minha esposa estamos de folga a
levamos com veículo particular, porém na maioria das vezes usa transporte
público.
Ela faz o que é preciso fazer.
● Outra filha faz só
faculdade, as aulas estão interrompidas.
É a única que está de fato em quarentena.
Até demais, mal sai do quarto.
Vejam que dos quatro, três tem possibilidade
de trazer Covid para casa.
Não tem o que fazer, fora manter as normas
de higiene.
Se um de nós contrair Covid vai se sentir
culpado do que!?
Sou o mais velho, fui diagnosticado com
hipertensão; em casa (teoricamente) sou o que corre mais risco de algum
agravamento.
Espero que não, mas se eu morrer … morri.
Tento evitar, mas não vou deixar de fazer o
que tenho que fazer por um medo doentio de morrer.
Sempre (não só agora) fui consciente da
possibilidade de eu morrer a qualquer momento.
Em função disso sempre estimulei minha esposa
e filhas a serem independentes.
De certo será uma ferida terrível, mas nada
que o tempo não cicatrize, tantas esposas perdem o marido, tantos filhos perdem
o pai, a vida segue.
O mesmo serve para minha esposa e filhas.
Sempre tentei as deixar conscientes sobre a brevidade
da vida, para morrer basta estar vivo.
Durante a pandemia tenho postado o quanto
outras doenças, criminalidade, acidentes matam.
A Covid é só uma possibilidade a mais.
Ciente da morte estar sempre tão próxima trato
todas as pessoas com o máximo de respeito possível.
Quando morrem não há nenhum tipo de remorso,
tenho meu momento de luto, a vida segue.
Minhas filhas tem uma vida muito boa.
Em casa têm fartura, paz, segurança.
Se precisam ou querem sair tem liberdade,
confiança.
E se acontecer a morte de uma filha?
Me dá arrepios imaginar isso.
Vai ser um longo luto, mas sei que o tempo
vai cicatrizar a ferida, tantos pais perdem seus filhos e a vida segue.
Porque não tenho medo doentio da morte, minha
ou de alguém próximo?
O medo doentio da morte nos impede de viver
da maneira que “eu” acredito satisfatória.
Nos prende a crenças dogmáticas.
Nos leva a histeria/pânico em situações que
temos mais chances de sobrevivência se mantermos a calma, usarmos o bom senso.
O medo doentio da morte faz com que muitos
simplesmente ignorem esse acontecimento.
Criam uma ilusão que ela não existe para eles
próprios ou pessoas próximas.
Só os outros, mais distantes, morrem.
Acontece o óbvio, mais cedo ou mais tarde a
realidade se impõe.
Sem preparo mental nenhum, muitos desabam,
entram em depressão terrível.
Não raro, carregam algum remorso para o resto
de suas vidas, porque tinham a ilusão que a pessoa próxima era eterna
(inclusive biologicamente), acreditavam que tinham todo tempo do mundo e encheram
o relacionamento de “mesquinharias”.
Mesquinha: Condição da pessoa cuja visão e/ou espírito
são limitados; desprovido de magnanimidade.
Natureza do que é medíocre; fútil.
Se preocupa só com seus próprios sentimentos
e desejos ignorando o dos outros.
Para
viver melhor, mais eficientemente; pensar no fim é o melhor começo que
conheço...
A pessoa é adulta, está mais do que bem informada, culpar o Estado por suas atitudes é muita cara de pau.
Quem tem exagerado medo da morte se tranque em casa pra sempre, não é só o Covid que pode matar.
E se eu ficar doente?
Se tiver respirador disponível, pago meus impostos, tenho direito de usar.
Se não tiver ... paciência.
O crematório é logo ali.
Depois de morto não vou sentir mais nada mesmo.
[Postado em 3 de Maio 2020]
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