XICO GRAZIANO
06 Agosto 2013
O País sem o MST.
Noutro dia, em
seminário do PT na Bahia, Lula lançou um enigma:
"Eu fico
pensando o que seria o Brasil se não fosse o MST".
A resposta me brotou
fácil, haveria mais prosperidade e paz no campo.
Explico o porquê.
O Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) originou-se em 1979, motivado pela luta
agrária dos colonos gaúchos nos municípios de Ronda Alta e Sarandi.
O regime militar,
que comandava o País na época, tentou desmantelar, pelas mãos do famigerado
coronel Curió, aquela inquietação camponesa.
Ao contrário, porém,
sustentado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e apoiado por líderes da
oposição democrática, o episódio prosperou, agigantando-se o acampamento de
sem-terra.
Cinco anos depois
(1984), 8 mil pessoas invadiram a Fazenda Annoni, demonstrando uma ousadia que,
de pronto, ganhou a simpatia da opinião pública.
O sucesso da
empreitada guindou a nova organização à liderança da ação
"antilatifundiária" no campo.
Seu antípoda, criado
no debate da Constituinte, era a União Democrática Ruralista (UDR).
Seu rival
"interno", de quem procurou sempre se diferenciar, era a Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), considerada
"pelega" pela esquerda de então.
A sociedade em
mudança adotou o MST.
Assim, no
estrebuchar da ditadura, renascia no País a tese da reforma agrária.
Agora, porém, a
causa vinha despida de sua lógica econômica, conforme fora idealizada nos anos
1960, para se carregar de conteúdo social.
Com a bênção da
Teologia da Libertação, um pedaço de terra redimiria os excluídos do campo.
Nascia uma utopia
agrária.
Ruíra em 1989 o Muro
de Berlim.
Por aqui, findos os
anos de chumbo, avançava a redemocratização.
Simultaneamente,
avançava a modernização capitalista da agricultura, modificando a dinâmica do
agro; antigos latifúndios viravam empresas rurais.
Mais à frente, o
Plano Real retirou da terra ociosa seu ganho especulativo, empurrando-a para a
produção.
Começava o império
da tecnologia na agropecuária brasileira.
Nesse caminhar da
História, a bandeira revolucionária do MST começou a perder seu brilho.
Foi então que a
organização decidiu, em 1995, mudar sua estratégia, partindo para o confronto
direto com os fazendeiros do País: invadiu a Fazenda Aliança, situada em Pedra
Preta (MT).
Pertencente a um
conceituado líder ruralista, a propriedade mantinha excelente rebanho, elevado
rendimento, 29 casas de alvenaria, 160 quilômetros de cercas, 21 empregados
registrados, reserva florestal intacta, um brinco produtivo.
Acabou nesse momento
o MST "do bem".
Inaugurando a fase
ulterior da crise agrária, as invasões de propriedades tomaram conta do Brasil,
avançando especialmente contra as pastagens de gado.
Incontáveis
"movimentos" surgiram alhures, arrebentando cercas, roubando gado,
fazendo "justiça" com as próprias mãos.
Verdadeiras
quadrilhas disfarçaram-se de pobres coitados e saquearam regiões, como no sul
do Pará. Banditismo rural.
O MST
militarizou-se.
Seus quadros
passaram a fazer treinamento centralizado, o comando definiu regras de
comportamento e seleção.
Centros passaram a
oferecer cursos de capacitação, baseados na cartilha básica intitulada Como
Organizar a Massa.
Doutrinação pura.
Nascido como
"movimento social", o MST transformou-se em rígida organização,
adentrando a cidade.
Recrutando
miseráveis urbanos, montou uma "fábrica de sem-terra" no País.
Nunca mais a reforma
agrária encontrou seu eixo.
Como teria sido a
reforma agrária sem o terrorismo das invasões de terras?
Primeiro, seria
certamente um programa mais bem planejado, articulado, e não um remendo açodado
para resolver conflitos.
Não trombaria com a
agronomia nem com a ecologia, projetando assentamentos tecnicamente viáveis.
Não faria da
reforma agrária um foco de devastação ambiental, conforme se verifica em toda a
Amazônia.
Não confundiria
remanescentes florestais com terra inculta, promovendo uma infeliz união da
miséria com a depredação ecológica, como, entre tantos exemplos, provam a
Fazenda Zabelê, no litoral de Touros (RN), ou a Fazenda Araupel, em Rio Bonito
do Iguaçu (PR).
Segundo, os
beneficiários da reforma teriam aptidão reconhecida para a lide rural, jovens
habilitados, filhos de agricultores familiares, jamais viriam dos excluídos da
cidade.
O vestibular da
terra seria a capacitação, nunca a invasão.
Os assentamentos
rurais estariam baseados na produção tecnológica, integrada ao circuito de
mercado, nunca firmada na roça de subsistência, isolada.
Os novos produtores
se emancipariam, seriam titulados, e não, como ocorre hoje, se tornariam
subservientes ao poder.
Terceiro, e em
decorrência dos anteriores, a reforma agrária seria menor em tamanho, porém
muito maior em qualidade.
Geraria produção e
renda.
Daria à sociedade
retorno do investimento público.
Hoje, acreditem, nem
se avalia o custo-benefício dos assentamentos.
Nunca se mediu
sequer a produção agropecuária advinda das áreas reformadas no Brasil, que
atingem 90 milhões de hectares, envolvendo 1,2 milhão de assentados. Ninguém
sabe quanto nem o que produzem.
Conclusão: O
distributivismo agrário resultou na mais onerosa e fracassada política social
da História brasileira.
Para se ter uma
ideia, o custo médio de cada assentado beira os R$ 100 mil, valor que manteria
uma família durante 13 anos recebendo um salário mínimo mensal.
Com uma agravante,
pelas mãos raivosas dos invasores de terra se criou no País um foco contínuo de
encrenca, antipatias, inimizades.
O que seria do
Brasil se não fosse o MST?
Respondo ao Lula,
tranquilamente: mais produtivo e fraterno no campo.
* Xico Graziano é
agrônomo, foi secretário de agricultura e secretário do meio ambiente do estado
de São Paulo.
Link - Estadão